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quarta-feira, 25 de abril de 2012

Takashi Murakami em Versailles


Bomba Relógio

Clarice,
você removeu apenas uma
muleta

Eu,
joguei todas as minhas pernas
em uma janela folheada a ouro
no 12º andar

Estou nua na vida
sem corrimão, acesso, botão de desliga
bluetooth
apple

com apenas algumas aspirações
deixo a vida me atravessar

ancorei no deserto e tudo
me marcou tanto
que fiquei com medo de dizer seu nome

troquei o carro pela moto
convenci meu coração a desamar por ser um coração muito viciado
deixei a minha própria casa
fiquei familiarmente conhecida como louca
e braba
um bicho solto
sorridente e perigoso

Há um vago para onde fujo
mas é onde absolutamente já estou

Há anos venho tentando remover
as marcas de luta
no meu braço

E a agressividade dos meus gestos
definem o meu escudo
esse mesmo
que me impedirá para sempre
de cruzar o portal da leveza

o vácuo
não há remédio para o vazio

o eco
não há respostas
para as perguntas que as paredes fazem

para onde não sorri?
por onde escapar no caos
sem estancar a minha força?

Se é pra viver eu tenho que sonhar

Só isso aqui
não me basta.

Virei uma bomba relógio
e tenho medo
do meu silêncio

implodir.


Ryana

todo dia o cotidiano atravessa o aparelho digestivo
estreito túnel que vai da boca ao fim

todo dia a mesma minhoca nos esfomeia
nos esfaqueia com seus contatos de metal

se por fora somos tato 
por dentro somos um cinza gorduroso

difícil de lavar

somos um curral para as tripas
curra para as ideias de alturas 

brancuras

ressurreições



Rubens da Cunha

segunda-feira, 23 de abril de 2012


Derecho del la calle Bolivar, Café POESÍA, Buenos Aires
DOS ENCONTROS
POR MARCO VASQUES
Publicada no jornal Notícias do Dia [23/04/12]
Ela olha para ele com a retina de abismo. Os olhares se cruzaram no imenso de suas solidões. Um homem, disse ela, um mistério se equilibrando na solidão do calendário. Quando menos percebe, a vida não é mais para ele, nada mais podem seus ossos frágeis. Passos firmes não mais. Apenas uma sentença de esquecimento logo à frente. Ela viveu em vias de precipitar a morte. Disse que os elevadores são seguros demais. Esteve por tentar um voo, mas recuou na lassidão de sua cama. Estendeu o corpo para a escuridão. Mas o barulho, o ruído, as falas, as gentes, o trânsito, todo o entorno lhe causava uma ânsia de alegrias vomitadas.
Ela cultiva sete loucos tatuados nos olhos. Quando deseja, solta um e outro louco pela boca e, quando quase liberto, recoloca o bicho em sua morada de origem. Fabricar fantasmas é tarefa muito gótica; prefere comer os fantasmas sem que eles saibam. Assim, não procria e não prolifera o coração para fora. Sim. Ela pensa que ter filhos é colocar o coração para fora do corpo. E nisso reside muita solidão. Aliás, do desejo à solidão estamos assim condenados. Uma condenação estranha esta de ser um coração estourando nas esquinas, competindo com o concreto, com o ferro e com toda a secreção do corpo.
Depois que sua avó morreu, ela descobriu, da forma mais dolorosa, que a distância para o amor é fragilidade. E que na lágrima do outro só Alice pode se banhar até o afogamento. Até o quase afogamento. Porque, como Alice, é necessário que se tenha várias formas, vários tamanhos na mesma vida. Senão o corpo não resiste ao primeiro impacto. A mesma luz que possibilita ver é um campo de escuridão. E assim, confessa ela, vamos sendo estas máscaras, estas couraças que construímos para sentido nenhum. E quando o sentido está quase drogado vem uma frase de abandono. Um sorriso de dentes perdidos, todos cantando Beethoven e Bach no esquife que dobra a esquina. São assim as contradições; a morte está sempre de vigília. Mas não deveria estar apagada?
Ele? Manteve toda esperança possível. Escondeu-se no canto esquerdo do olho direito que ela cultiva na saliva. Só sai de lá se ela o expulsar compulsoriamente. Navegaram horas por confissões e pedidos. Ao final da noite, a imagem de um homem - com pés de urso, gigantes, caminhando pela estrada, indiferente aos mil atropelamentos sofridos - vai se desfazendo na paisagem daquele encontro de palavras segredadas. Lavaram, juntos, os olhos com sabão em pó porque a coluna vertebral de suas vidas estava quebrada. Escolheram uma esquina para comer, noutro dia, doces e correntes de esmeraldas.

UMA CIDADE QUE REDESCOBRIU O RIO

Acabada a regata da volta ao mundo a cidade amanhece mais satisfeita. A palavra satisfeita traduz a sensação de se ter feito um trabalho  apreciado, elogiado e isso se reflete no orgulho pessoal da cidade como um todo. Vi pessoas contentes, crianças se divertindo, um clima de civilidade que tomou conta daquele espaço delimitado, que aos poucos comportou nossa felicidade e o mais importante: nos trouxe de volta o rio.
Se existe alguma coisa bonita na paisagem de nossa cidade, esse lugar é o rio. Um rio grande, de larga travessia que com o fluxo dos navios e barcos de pesca, dá movimento e vida aos séculos de nossa constituição como povoado, vila, cidade. É o sangue que nos recicla, nos oxigena e portanto  nos traz a vida. Não existe Itajaí sem rio porque é do rio que vem nossa grandeza. A cláusula pétrea firmada entre o homem e sua geografia.
Por mais que nos neguemos a sermos  peixeiros, peixeiros é o que somos. Marinheiros é o que somos. Estivadores é o que somos. Comedores de siris, habitantes da margem direita, batizados pela luz que aqui é tão diferente, banhados pelo rio que aqui é tão generoso e ás vezes tão violento, inchando sua barriga de enchente e mostrando quem de fato manda.
Se a Volvo Ocean Race nos trouxe a alegria do evento, da modernidade e do novo paradigma cultural que muda a relação da cidade com os próximos eventos, especialmente a Marejada, nos trouxe de volta o rio, a beleza do rio e a possibilidade de aproveitarmos melhor o que ele tem pra nos dar.
Se nas últimas décadas empilhamos suas margens de construções públicas e privadas, se ao longo das décadas o escondemo como uma via suja de navegação, a regata nos mostrou outros caminhos. Que façamos mais pelo rio, que olhemos mais para o rio. Que amemos mais o rio. 



Volvo Ocean Race - Regata In Port Itajaí - 21/04/2012

sábado, 21 de abril de 2012

enquanto lavamos os mortos
a lua se levanta sozinha
iluminando a noite de itajaí

repito esse processo esse rito
para a respiração que necessito

necessito dessa crença
por incrível que pareça
a vida parece boa


quarta-feira, 18 de abril de 2012

Romancismo - Vitor Paiva

Cérebro no peito

Coração na cabeça

Sob o sol de um livro
tracei dois fantasmas
iluminei os fotogramas da vida real
e me apaixonei pelas palavras

Relances, romantismos, Roma antiga
Cérebro no peito
Coração na cabeça
Fazer caber todo o mundo
no quarto e sala que sou eu
sozinho, na confusão dos fotogramas da vida real
E em um segundo de trilha
todos os instrumentos
Cérebro no pé coração da cabeleira

Pensar e pernoitar nas ideias
te ver por acaso
e, de repente, tudo certo
tudo cem por cento na cena
Cérebro no copo
Coração no cinema
Largar mão das páginas
e se derramar pra fora dos fotogramas da vida real
fazer sair todo o mundo
do continente da minha ilha
e te servir a sobremesa
Cérebro nos ombros
Coração na beleza

Apoiar um livro na cabeça
amarrar um em cada pé
um em cada mão
ou atirar pela janela
as palavras dos fotogramas da vida real?
Transformar em filme mudo
um feeling de final feliz
Olhar, suspirar, deixar
o paladar se transformar em roteiro
o cheiro ser o juiz

Cérebro da boca
Coração nos quadris

Se atirar
no mundo dos fotogramas da vida melhor
e esperar acontecer deu te encontrar
e que qualquer primeira página
seja um romance enorme e maravilhoso
e que tudo aconteça então
Cérebro ao vento
Coração na mão

sábado, 14 de abril de 2012

Fotografia de Cristiano Moreira

Testes

algo com que sonhei esta noite
ficou nítido como a imgem
que saquei na camara clara
fotografar sonhos é trabalhar
com a moeda quente

com a órbita de um asteróide
de tumultuosa corredeira
algo com que sonhei esta noite
está aqui, entre imagens antigas
e novas experiências

como trocar uma lâmpada
segurando o filamento
em uma tarde de outono e trovoada
descalço dentro de uma bacia vermelha
com água ao tornozelo

as estrelas que vi depois disso
saíram do saleiro de minha infância
sal grosso a esmo pela retina
diluindo-se no que denominei sonhar

Cristiano Moreira

quarta-feira, 11 de abril de 2012

10 IMAGENS DA HOLANDA

Quinta:

dentro da palma da mão
wilhelm guarda um diamante

um parante judeu
lhe trouxe da antuérpia

uma alegria aguda lhe toma o corpo
e a pedra tem uma dona de nome theodora

amsterdam parece mais clara nesse dia


Floriano.





terça-feira, 10 de abril de 2012

ABRIR A CASA

abrir a casa
durante a chuva

a alma absurda
abrir a casa

durante a muda
da alva lua


MARCELO STEIL

sábado, 7 de abril de 2012

O DOCE DE TEU SABONETE

o doce de teu sabonete
frequenta esse ambiente

vago de silêncios
repleto de lembranças

o cheiro nasce nos cabelos
como um azeite de amêndoas

recende a campo molhado
flor na pedra colhida

cheiro trasnmutado de desejo
de te ver em nipori no verão

Floriano


terça-feira, 3 de abril de 2012

Imagens da Holanda

Quarta;


numa caderneta guilherme ainda bem moço

anota receitas de revelar fotos

sua primeira foto revelada

é de wilhelm num carro de neve

Chama atenção o quase todo cinza

Dos prédios da utrechtsestraat