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quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Joel-Peter Witkin, sem data



O vendaval lanha as árvores que fustigam as vidraças do jardim de inverno do senhor Caligari. Ele fuma erva, sorve líqüido. Uma deusa aquática dirige-lhe a voz, de modo familiar, para perguntar alguma coisa, algo banal que seja, mas, em verdade, apenas para retê-lo consigo e sentir a língua escamosa dele na sua pele branca de uma neve de romance russo. Com os dedos hábeis e grossos o senhor Caligari ergue a saia da deusa aquática e a violenta ali mesmo entre as plantas do jardim de inverno. Que amor mais escuro, choram árvores da noite – galhos contra o muro – árvores que espancam sem dó nem piedade a ampla janela envidraçada. Antes de vestir a roupa, ela ainda volta a cabeça, e, na forma do costume, dá adeus com a mão que, só agora, o senhor Caligari percebe que é uma garra de pássaro. Ele vê a deusa aquática atravessar o hall com plantas ornamentais – ou seria uma plantação de cannabis? – ele a vê, sim, ir embora, dobrar a esquina, depois o senhor Caligari se dirige à piscina de seu casarão onde há um vento folheando as páginas de um Kaváfis, a vitrola rodando um jazz de Duke Ellington e, com assombro, vê o cu de um besouro de onde vaza a passacale de Buxhetude a mais bela música sacra do barroco alemão.


Fernando José Karl

Um comentário:

Antonio Carlos Floriano disse...

Feliz aniversário Fernando Karl. Da sonora fonte escondida na imagem do claustro dos sagrados corações, ainda posso ouvir o riso louco de um menino.