AOS NOVOS CRONISTAS
Fui falar com alunos da Escola Municipal Pedro Ivo Campos, de Joinville, sobre a crônica. Eles estão participando das olimpíadas de português, cuja meta a ser cumprida é a escrita de uma crônica. O tema é o lugar onde vivem. Adolescentes no auge da agitação parecem não combinar muito com a necessidade de observação, de atenção a detalhes insignificantes que se exige de um cronista. Alguns me pediram quase que uma receita sobre como escrever crônicas. Percebi que receitas são falhas, mas alguns métodos podem ser válidos quando se quer enveredar pelo caminho da crônica, mesmo que seja para cumprir um dever como no caso dos alunos. O que, muitas vezes, não é diferente do caso de cronistas, pois temos um compromisso semanal que cumprimos, com vontade ou sem vontade, com assunto, ou sem assunto. Talvez o procedimento mais tradicional do cronista seja a observação da vida, do cotidiano mais ínfimo, menos espetacular e isso, sem dúvida, me parece o mais difícil, tanto para adolescentes, quanto para qualquer pessoa presa ao ritmo frenético a que estamos submetidos. Observar pequenezas é trabalho árduo e inútil, dois adjetivos que parecem não combinarem entre si, mas que formam a base tanto de um cronista, quanto de um poeta. Árduo, porque temos que ficar atentos, (ou desatentos, poeticamente falando) aos desvios da normalidade, às surpresas breves que nos acontecem, aos espantos, aos comportamentos diferentes, às belezas mínimas como um rastro de formigas na parede, uma folha quase caindo da samambaia, um pássaro que entra em casa de repente, uma criança que nos diz algo desconcertante, um andarilho, um artista de rua, uma mulher grávida, um homem sem as mãos etc. etc. Essa observação é inútil justamente porque não altera radicalmente a vida: não é um acidente, um suicídio, uma catástrofe, uma festa gigantesca, um casamento. É apenas a banalidade da vida diária se colocando na frente das pessoas. A maioria passa batida. Não dá nenhuma importância. O cronista é o sujeito que se detém. Que por profissão tem que arrancar beleza, delicadeza, espanto dos acontecimentos. Quanto mais insignificante o acontecimento, mais o cronista se esforça para torná-lo grande, para retirar dele uma reflexão qualquer que possa dividir com seu leitor. Sem dúvida, esse olhar sensível para o mundo ao seu redor deve ser o mais difícil para um adolescente que está tendo que escrever uma crônica. Parece que essa contemplação é algo adquirido com a idade, tem muito a ver com memória, com olhar a vida de um ponto de vista menos urgente, ou menos adolescente. Talvez o caminho para os novos cronistas que estão nascendo nas escolas seja justamente trazer para a crônica seu mundo urgente, rápido, internético, virtual. Estabelecer o contato com a vida por esse caminho e aí desenvolver seu texto. A crônica já não é somente aquele texto com linguagem simples que pretende ser uma conversa com o leitor, mas ainda se mantém firme no cotidiano, ainda é o meio mais eficaz de fotografar acontecimentos desimportantes e de trazê-los à luz e fazer com que o leitor perceba que geralmente é no ínfimo que habita a grandeza da vida.
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