A seção POEMA SINGULAR, desta quinta-feira, traz o poema O ferrageiro de Carmona do poeta João Cabral de Melo Neto. Lembramos aos leitores que cada singular seleciona um poema de sua predileção e que tenha um significado especial na vasto universo de poemas. Já tivemos poemas selecionados por Dennis Radünz e Raquel Stolf. A escolha de hoje é do poeta Antonio Carlos Floriano, o idealizador desta coluna. Na próxima quinta-feira é a vez do poeta Fernando José Karl apresentar seu POEMA SINGULAR.
O Ferrageiro de Carmona
Um ferrageiro de Carmona que me informava de um balcão:
"Aquilo? É de ferro fundido,
foi a forma que fez, não a mão.
Só trabalho em ferro forjado
que é quando se trabalha ferro.;
então corpo a corpo com ele.;
domo-o, dobro-o, até onde quero.
O ferro fundido é sem luta,
é só derramá-lo na fôrma.
Não há nele a queda de braço
e o cara a cara de uma forja.
Existe grande diferença
do ferro forjado ao fundido.;
é uma distância tão enorme
que não pode-se medir a gritos.
Conhece a Giralda em Sevilha?
De certo subiu lá em cima.
Reparou nas flores de ferro
dos quatro jarros das esquinas?
Pois aquilo é ferro forjado.
Flores criadas numa outra língua.
Nada têm das flores de fôrma
moldadas pelas das campinas.
Dou-lhe aqui a humilde receita
ao senhor que dizem ser poeta:
O ferro não deve fundir-se,
nem a voz ter diarréia.
Forjar: domar o ferro a força,
não até uma flor já sabida,
mas ao que pode até ser flor...
se flor parece a quem o diga."
(João Cabral de Mello Neto)
2 comentários:
Esse finalzinho me recorda algo bem infantil: uma cena do desenho Bambi da Disney em que o já referido sai a conhecer a floresta e as flores, cheira todas elas, aprende o nome, e confundi um gambá com flor; todos riem, mas o gambá diz pra ele: "você pode me chamar de flor se quiser chamar". Incrível eu ainda me lembrar dessa cena. Enfim, "cabei" com o poema? Não, né?
Um beijo, Marco, até segunda!
Outro beijo querida, outro beijo. Marco
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