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quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Uma crônica de Marco Vasques


Todos os nomes

Roberto era mesmo um estudioso dos nomes. Começou com os femininos, mas se rendeu a todos os gêneros. Ele procurava a pele no nome. Construiu mapas dos nomes e os comportamentos inerentes a cada um. Era a sua maneira de amar dizia sempre que um amigo perguntava. Durante sua vida escolar colecionou 8.976 nomes. Agora, aos 45 anos, já estava na casa dos 1.987.967.333. Estudava tudo. Fernanda é um nome comum a partir dos anos 1980. A multiplicação de Isadoras veio nos anos 1990. Isadora Duncan (a bailarina norte-americana) e Isidore Ducasse (o poeta uruguaio-francês) estavam no mesmo mapa. Os gêneros já não importam mais. Afirmava, em público, que os dois artistas eram praticamente uma simbiose autêntica. Um está na poesia do outro. Ela nas palavras, ele na dança. Roberto divagava. Buscava referência nos nomes bíblicos, nos personagens de cinema, literatura. Andava pelas ruas colhendo nome, profissão, data de nascimento de ambulantes, mendigos, garçonetes (Roberto sempre afirmou amar as garçonetes e enfermeiras), pedreiros, bebedores profissionais... A lista de experimentos e histórias dos nomes fez de Roberto um consultor público. As pessoas o procuravam pelas mais diversas razões: jogar no bicho, procurar o nome certo da namorada, ver o nome ideal para o futuro do filho, casar, descasar, terminar namoro, loteria, emprego, ganhar dinheiro sem esforço, sexo, poder... É infinda a saga de Roberto que se ressentia por nunca ter lido o livro Todos os Nomes do Saramago. Foi num final de tarde de chuva fina que Roberto teve um sobressalto. Ela estava à beira da estrada. Vestida de luzes (azul, âmbar e vermelha). Tudo nela era expressivo. Ando meio envergonhada foi a mensagem que ela “emitiu” a Roberto. Mas qual o seu nome? Meu nome é Arvore de Natal, custo R$ 3.700,000,00 e não consigo uma bala para doar ao menino do semáforo. Roberto anotou o nome, balançou a cabeça e seguiu para o hospital Celso Ramos. Foi buscar o filho Robert Frost e a mulher Sarah Kane que ali passaram o dia a espera de atendimento. Sarah abraça Roberto. Um silêncio sonoro e tudo foi entendido. Seu filho morreu após 15 horas de espera. Tudo porque a entidade não dispunha de um medicamento que custa R$ 10.00. Conta a lenda que Roberto nunca mais festejou um natal e escondeu todos os nomes dentro do esquife do filho. Emudeceu.

3 comentários:

Rubens da Cunha disse...

muito bom, eu fiquei indignado da árvore ser mais baixa do prometeram... além do preço, claro...

Marco Vasques disse...

Ahhhhh.... é dose né!!! Overdose!

Linda Graal disse...

hehehe!!