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segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

BRUZUNDANGAS DE SEMPRE

            Em Bruzundangas se faz inimigos com muita facilidade. Se você discorda de um doutor, está ferrado, porque ele ainda não percebeu que o doutor é apenas alguém que sabe muito sobre quase nada. E como todo doutor pensa que é doutor em tudo, já se vê que estamos espetados. Se você se opõe a um político que insiste em buscar saídas inteligentes para problemas óbvios é mais uma vez execrado. Para espanto geral da nação, nasceu, em Bruzundangas, nas últimas décadas, uma espécie antes não identificada e que, com muita facilidade, se rebela inimigo à primeira oposição.

Trata-se do artista-político. Tão nocivo, ou mais, que os políticos e os doutores. Eles são tão políticos que chegam a meter inveja em políticos profissionais. E são tão doutorais que chegam mesmo a envergonhar a empáfia dos verdadeiros diplomados. Não bastasse o antagonismo de tal nascimento, a coisa vai se desdobrando de tal jeito que já não sabemos mais quem é o político, quem é o artista e quem é doutor.

Sabe-se apenas que são todos propensos à inimizade. Porque em Bruzundangas é quase proibida a crítica e a discórdia. Dos políticos nada se pode dizer, porque são todos honestos; dos doutores muito menos, já que são todos sábios e, por fim, dos artistas ninguém pode falar, já que é sabido que são todos gênios e seus trabalhos brilhantes. O que dizer então de um artista-político?

 A definição de uma artista-político ainda não foi feita pelos doutores de Bruzundangas. Estão todos cautelosos com a nova espécie. Sabe-se apenas que eles têm verdades absolutas e certezas incontestes. Nunca duvidam de suas ideias. Sabe-se também que adoram fazer arte com o dinheiro público e se negam a mostrá-la ao público que, obviamente, pagou pela arte feita. Odeiam editais, porque são democráticos demais. Gostam de gozar de privilégios, aliás, privilégios que sempre contestaram quando eram só artistas.

A característica mais evidente, dizem os doutores em caracteristicologia, é irascividade. São irascíveis ao extremo. Basta alguém falar, escrever ou insinuar que não apreciou sua peça de teatro, seu filme, seu poema, seu romance, sua sinfonia, algumas de suas ideias, ou qualquer invento modernoide, que a guerra está estabelecida. Ah! Acaba de chegar um telegrama dizendo que outra característica dessa nova espécie é a de dividir o mundo em dois lados. Sim, bem maniqueísta mesmo. Com eles é assim: ou se está do seu lado ou se é inimigo. São uns quase suicidas, quase, vejam bem, diz Bolonho, o mendigo sem autoridade de Bruzundangas. Impossíveis de dialética, diz o papagaio de Bruzundangas.


Marco Vasques

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