UMA CONSULTA
_ Bom dia!
_ Bom dia!
_ Minha consulta está confirmada, certo?
_ Sim
_ Doutor Robert já está aí?
_ Aguarde um instante, vou comunicar que o senhor chegou.
_ Doutor, o senhor... senhor...
_ Aristides! Aristides!
_ Desculpe-me.
_ O senhor Aristides já está aqui.
_ Mande entrar!
_ Sim! O senhor pode entrar, pois ele lhe aguarda.
_ Bom dia!
_ Bom dia!
_ E então seu Aristides, como anda as coisas?
_ Nada bem doutor.
_ Como assim homem? Nada bem!
_ É o seguinte Doutor: eu ando meio atormentado. Sabe. Esta coisa de estar no mundo e daqui a pouco sumir! Essa coisa eu não consigo trabalhar. O Doutor já pensou que em 100 anos nenhum de nós, salvo raríssima exceção, estará aqui para ver no que desembocamos? Para onde conduzimos as coisas? Já pensou que tudo vai continuar andando sem as nossas presenças? Já pensou?
_ Hum...
_ E tem mais Doutor. Se estou caminhando pela manhã lá vem uma placa de carro AMS 0176. Aí eu já fico louco. Bem, aí tem alguma coisa. E já fico a ver sinais de minha morte naquela placa.
_Mas é só uma placa, Aristides!
_ Nem tudo é o que parece Doutor. Não é uma placa qualquer: MAS 0176. Pode muito bem ser um sinal, pois Aristides Morais da Silva, nascido em 76 tem só mais 01 ano de vida! Não pode? Um sinal do acaso! Uma luz para eu apressar meus projetos, para eu amar mais, para eu tentar me tornar mais humano, menos mesquinho!
_ Hum...
_ E se estou embaixo do poste, Doutor!
_ O quê?
_ É. Se estou embaixo de um poste penso logo que um fio pode rebentar e me matar. Aquela coisa da ACRONIA, sabe? Estar no lugar errado na hora errada. Já pensou! Tudo é tão fugaz. Eu posso tomar um suco infectado e morrer! Não viu aquele jovem! Ah! Uma picada de um bichinho minúsculo pode nos levar ao óbito! “Eu vejo morte em tudo que vejo”.
_ Hum... A música!
_ Sabe Doutor, quando ando pelas ruas e vejo um mendigo, ou um pedinte qualquer eu choro, porque minha imagem está refletida naquelas pessoas. Eu sou um mendigo! Eu sou a prostituta suja de sêmen!
_ Hum...
_ E se dou um mergulho no mar? Aí que é de arrepiar. Vejo todos os mortos que os mares do mundo já engoliram. Vejo todas as faces. É em lágrimas que estou mergulhado. Eu não sei mais o que fazer.
_ Hum...
_ Um noticiário da semana passada me deixa atormentado até hoje, dizia mais ou menos assim: uma mulher da cidade de Joaçaba, de apenas 25 anos, afogou seu filho, um bebê recém-nascido, num balde de água. Depois foi a um lago lavar roupas como se nada tivesse acontecido. Esfregou o bebê até desaparecer. Desapareceu nada! Está vivo comigo! Não consigo dormir. Fico pensando que aquele pouquinho de água, em minutos, virou toda água do mundo, Doutor!
_...
_ Vivo dizendo que nada importa porque vamos todos morrer mesmo, mas me importo com quase tudo que me cerca. Tudo me toca. O olhar daquela velhinha que passa as tardes na janela, aquele olhar não sai da minha pele. É uma fusão. Já cheguei a pensar que eu sou os olhos tristes daquela senhora de mais de 80 anos que insiste em me olhar todos os dias.
_... Hum... Manuel Bandeira! As pernas de Tereza! Os olhos de Tereza.
_ Doutor, que sociedade a nossa? Como pode o mundo se preocupar se alguém usa o não uma peça íntima e não ser apavorar por 500 crianças ficarem cegas, todos os dias, por imaginarem um prato de comida?
_ Hum...
_ Eu ouço os sonhos dos mortos quanto passo pelos cemitérios. Eu me apavoro com tanta voz emudecida. Onde foi parar o canto dos pássaros? E pela noite, na calmaria do mundo, minhas paredes choram. “Anjos escorem pelas paredes”. Um fogo me queima o estômago pela manhã.
_ Hum... Nelson Rodrigues! Camões, talvez!
_ Doutor...
_...
_ E então Doutor?
_ Então o quê, Carla?
_ Que tal esse seu Aristides, sujeito meio estranho, não?
_ Um coitado, Carla. Um coitado!
_ O que ele tem?
_ Doença rara, incomum e sem tratamento.
_ Coitado! E o que é exatamente?
_ SENSIBILIDADE! SENSIBILIDADE!
_ Bom dia!
_ Bom dia!
_ Minha consulta está confirmada, certo?
_ Sim
_ Doutor Robert já está aí?
_ Aguarde um instante, vou comunicar que o senhor chegou.
_ Doutor, o senhor... senhor...
_ Aristides! Aristides!
_ Desculpe-me.
_ O senhor Aristides já está aqui.
_ Mande entrar!
_ Sim! O senhor pode entrar, pois ele lhe aguarda.
_ Bom dia!
_ Bom dia!
_ E então seu Aristides, como anda as coisas?
_ Nada bem doutor.
_ Como assim homem? Nada bem!
_ É o seguinte Doutor: eu ando meio atormentado. Sabe. Esta coisa de estar no mundo e daqui a pouco sumir! Essa coisa eu não consigo trabalhar. O Doutor já pensou que em 100 anos nenhum de nós, salvo raríssima exceção, estará aqui para ver no que desembocamos? Para onde conduzimos as coisas? Já pensou que tudo vai continuar andando sem as nossas presenças? Já pensou?
_ Hum...
_ E tem mais Doutor. Se estou caminhando pela manhã lá vem uma placa de carro AMS 0176. Aí eu já fico louco. Bem, aí tem alguma coisa. E já fico a ver sinais de minha morte naquela placa.
_Mas é só uma placa, Aristides!
_ Nem tudo é o que parece Doutor. Não é uma placa qualquer: MAS 0176. Pode muito bem ser um sinal, pois Aristides Morais da Silva, nascido em 76 tem só mais 01 ano de vida! Não pode? Um sinal do acaso! Uma luz para eu apressar meus projetos, para eu amar mais, para eu tentar me tornar mais humano, menos mesquinho!
_ Hum...
_ E se estou embaixo do poste, Doutor!
_ O quê?
_ É. Se estou embaixo de um poste penso logo que um fio pode rebentar e me matar. Aquela coisa da ACRONIA, sabe? Estar no lugar errado na hora errada. Já pensou! Tudo é tão fugaz. Eu posso tomar um suco infectado e morrer! Não viu aquele jovem! Ah! Uma picada de um bichinho minúsculo pode nos levar ao óbito! “Eu vejo morte em tudo que vejo”.
_ Hum... A música!
_ Sabe Doutor, quando ando pelas ruas e vejo um mendigo, ou um pedinte qualquer eu choro, porque minha imagem está refletida naquelas pessoas. Eu sou um mendigo! Eu sou a prostituta suja de sêmen!
_ Hum...
_ E se dou um mergulho no mar? Aí que é de arrepiar. Vejo todos os mortos que os mares do mundo já engoliram. Vejo todas as faces. É em lágrimas que estou mergulhado. Eu não sei mais o que fazer.
_ Hum...
_ Um noticiário da semana passada me deixa atormentado até hoje, dizia mais ou menos assim: uma mulher da cidade de Joaçaba, de apenas 25 anos, afogou seu filho, um bebê recém-nascido, num balde de água. Depois foi a um lago lavar roupas como se nada tivesse acontecido. Esfregou o bebê até desaparecer. Desapareceu nada! Está vivo comigo! Não consigo dormir. Fico pensando que aquele pouquinho de água, em minutos, virou toda água do mundo, Doutor!
_...
_ Vivo dizendo que nada importa porque vamos todos morrer mesmo, mas me importo com quase tudo que me cerca. Tudo me toca. O olhar daquela velhinha que passa as tardes na janela, aquele olhar não sai da minha pele. É uma fusão. Já cheguei a pensar que eu sou os olhos tristes daquela senhora de mais de 80 anos que insiste em me olhar todos os dias.
_... Hum... Manuel Bandeira! As pernas de Tereza! Os olhos de Tereza.
_ Doutor, que sociedade a nossa? Como pode o mundo se preocupar se alguém usa o não uma peça íntima e não ser apavorar por 500 crianças ficarem cegas, todos os dias, por imaginarem um prato de comida?
_ Hum...
_ Eu ouço os sonhos dos mortos quanto passo pelos cemitérios. Eu me apavoro com tanta voz emudecida. Onde foi parar o canto dos pássaros? E pela noite, na calmaria do mundo, minhas paredes choram. “Anjos escorem pelas paredes”. Um fogo me queima o estômago pela manhã.
_ Hum... Nelson Rodrigues! Camões, talvez!
_ Doutor...
_...
_ E então Doutor?
_ Então o quê, Carla?
_ Que tal esse seu Aristides, sujeito meio estranho, não?
_ Um coitado, Carla. Um coitado!
_ O que ele tem?
_ Doença rara, incomum e sem tratamento.
_ Coitado! E o que é exatamente?
_ SENSIBILIDADE! SENSIBILIDADE!
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