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domingo, 20 de junho de 2010

Uma crônica de Rubens da Cunha

A CORAGEM DOS FINAIS

Assisti nos últimos meses uma sequência de filmes que me chamou a atenção pelos seus pontos em comum: eram norte-americanos e tinham finais corajosos. Os Estados Unidos, como se sabe, imperam quando o assunto é cinema, sobretudo, esse cinema mais comercial. Sempre foram mestres nesse aspecto. Talvez por isso as transformações ocorridas em seu cinema sejam o melhor retrato da nossa sociedade contemporânea. Penso que o cinema norte-americano ficou, em sua imensa maioria, absurdamente superficial como uma resposta à superficialidade do nosso tempo. Superficialidade, aqui entendida como uma espécie de preguiça, de costume em receber tudo devidamente digerido, como se fôssemos eternos filhotes de passarinho recebendo a comida na boca. É visível que “mastigar”, “digerir”, muitas vezes “ruminar” uma informação, uma cena, um final de filme trata-se de um esforço demasiado para a maioria das gentes. Dos filmes que eu vi, dois jamais seriam filmados hoje com o mesmo roteiro (não falo aqui de atualizações normais como o tempo, o espaço ou a técnica cinematográfica, mas simplesmente da manutenção da coragem dos finais). O primeiro é “Black Christmas” um terror mediano, que foi lançado 1974, dirigido pelo homem que deu ao mundo o primeiro e o segundo “Porky’s”. A coragem desse filme está em enganar os personagens e, consequentemente, o público, deixando inúmeras possibilidades em aberto na cena final. Eis algo que não é mais permitido pelo público médio: um final aberto, que não resuma, que não entregue e finalize bem finalizada a questão. Talvez o último grande final de um filme norte-americano tenha sido “Seven”, e lá se vão 15 anos, quando naquele saudoso 1995 David Fincher nos mostrou o que era coragem. “Black Christmas” teve uma refilmagem em 2007, pelo trailer e pela sequência final que está no Youtube, o assassino é devidamente revelado e assassinado pela mocinha sobrevivente, enfim, mais do mesmo. Outro que seria impossível de ser filmado nos dias de hoje é o clássico “Os Pássaros” de Alfred Hitchcock. O filme não apresenta motivos para o ataque dos pássaros e também não apresenta nenhuma solução humana para a situação. Pensando na possibilidade de “Os Pássaros” ser um filme inédito, só essa falta de motivo e essa falta de explicação no final o lançaria no inferno do prejuízo. O público de hoje se recusa a não receber os motivos e as explicações devidamente prontinhas para a viagem. Não falo de que o cinema tenha que levantar sempre questões filosóficas inacessíveis, mas também não precisaria ser tão raso, tão fácil de se adivinhar tudo o que vai acontecer, com meia hora de antecedência, algo que está acontecendo em pelo menos 90% dos filmes norte-americanos, sejam de que gênero for. Assim, para quem não quer ser alimentado na boca com ideias mastigadas, resta apenas ir para o outro lado do mundo, lá no Japão e na Coreia, que é de onde estão vindo os cineastas com colhões para impor ao mundo o que é cinema feito com coragem e criatividade. Só que o sistema é cruel, pois muitos desses filmes já estão sendo refilmados pelos EUA, adaptando-os, claro, para a superficialidade dos nossos tempos.

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